Olá meu amor,
Tantos anos passados e eu nunca te escrevi. Não sei se
por preguiça ou por desleixo meu. Sempre disseste que não tinha habilidade para
as palavras e que só entendia de números e equações. Talvez tivesses razão - tinhas
sempre! Logo tu, sempre tão dona do teu nariz, sempre tão refilona mas ao mesmo
tempo tão meiga e doce. E eu? Eu sempre tão preocupado com integrais e derivadas.
Eu sempre tão banhado de desculpas e ausências. Eu sempre tão distraído de ti,
sempre tão longe de nós.
Hoje que partiste, percebo que a matemática de nada me
valeu. Hoje que partiste, percebo que não existem fórmulas que te tragam de
volta. Hoje que partiste, percebo que o meu semblante carregará para sempre o pedaço
de destino perdido que sou, numa infinidade de estonteantes e singulares
possibilidades de decisões que podia ter tomado. Hoje que partiste, estou aprisionado
num vazio que os números não preenchem. Enterrado no fardo e na culpa - porque
hoje sozinho, revejo-me nas palavras que um dia me escreveste:
‘’Sim a matemática
resolve problemas reais - colocou prédios ao alto, criou computadores, permitiu
ir à lua e voltar. Sim a matemática soluciona questões da vida, mas não ensina
a viver João! Não ensina a cuidar. Não existem equações que definam a
percentagem de carinho ou a quantidade de atenção que deves dar; O tempo que
deves dedicar a ser feliz também não se conta, não se calcula. E eu até posso
não entender nada de matemática, mas compreendo a vida. Viver não é certo nem
preciso como os cálculos. Nunca te esqueças: Não há matemática que resolva a
escassez de amor.’’
(Sempre tiveste razão)
Com saudades,
O teu marido e
(solitário) professor de matemática
1 comentário:
amoroso! como tu :)
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