Um dia destes lá ia eu no autocarro num percurso habitual para a faculdade, sentada no lugar do costume - o primeiro atrás do motorista. Como toda a gente sabe, é um dos sítios mais susceptíveis para uma pessoa se ter de levantar quando o veiculo está cheio. No entanto lá ia eu no meu assento predilecto.
Momentos mais tarde, entrou uma senhora idosa, nos seus 70 e tal anos, com o seu chapelinho branco. A senhora ficou em pé, mesmo ao meu lado. No entanto haviam dois lugares nos assentos com prioridade. A senhora não se sentou. Estava a fazer-me confusão. Decidi perguntar-lhe se ela se queria sentar onde eu estava. Ao que ela me respondeu num tom doce - A menina dá-me o lugar? Sorri-lhe e respondi-lhe que sim. A senhora sentou-se e eu fiquei em pé, do lado dela.
Ao longo da viagem um dialogo começou a desenrolar-se, começou com a simples paragem onde entrou, passou para a paragem onde ia sair, seguiu-se o destino que a levava a esse local, até que chegou à sua história de vida. Engoli em seco, apetecia-me chorar, abraça-la, agradecer-lhe por ser assim. Dei-lhe a mão. Numa pequena viagem de autocarro aquela senhora tornou-se não só uma referencia para mim mas também uma lição.
O seu destino? O hospital. O motivo? Um exame. Porquê? Um cancro.
A senhora do chapelinho branco tinha acabado a quimioterapia e ia saber se aquele pesadelo tinha ou não acabado. Já tinha o cabelinho a crescer, mostrou-me com orgulho dizendo que as netas falavam que parecia um ursinho de peluche. Sorri.
Mas a história não acaba por aqui. 6 anos atrás tinha perdido uma filha com 45 anos que tivera um cancro que em 2 anos se espalhou por todo o corpo. As netas já não tinham pai e tinham acabado de ficar sem mãe e a senhora tinha acabado de ficar sem filha e tinha de cuidar de duas netas completamente sozinha.
A minha questão é: Como esta senhora consegue sequer viver? Como é que aguenta? Onde vai buscar a força? Como consegue olhar daquela forma alegre para a vida?
No olhar dela vi dor, vi saudade, mas mais que tudo vi esperança, vi amor.
Percebi que num instante a vida se vai, num instante somos reduzidos a pouco, mas que cabe a nós deixar ou não que tudo isso nos destrua, cabe a nós ou não ver a beleza do que nos rodeia, do que nos resta no meio de tanto sofrimento.
7 comentários:
Depois de ler isto penso o quão abençoada foste por aparecer assim uma pessoa no teu dia talvez "dia normal"... Uma história triste, mas acho que encheu-me o coração tanto pelo teu gesto como pelo "ursinho de peluche" :)
Há pessoas que, sem dúvida, são luz...
É verdade, mudou completamente o meu dia! Sem duvida uma lição de vida. É uma senhora com o coração gigante! Um beijinho :)
Sem duvida! Fazem-nos repensar muito sobre a vida!
Não somos de facto nada.
Temos tanto para aprender com os mais velhos e elogio-te pela a atitude tomada, temos que andar mais atentos aos olhares que nos cruzam os dias, todos tem algo para nos oferecer!
As pessoas mais velhas conseguem ter uma capacidade fascinante de encarar as coisas da melhor forma, até mesmo um cancro.
Vejo isso pela minha avó, sempre convivi com ela, ainda convivo com ela, e tem revelado uma força que eu nunca pensei que ela tivesse guardado. Sempre disse que têm um coração enorme, mas pode ser ainda maior ♡
Que história de partir o coração. Eu acho magnífico que existam pessoas com toda essa força. Espero que a senhora tenha recuperado!
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