quarta-feira, 14 de junho de 2017

Pagar pelo Direito de Sobreviver


Olhamo-nos, aterrorizados pelo pânico, aturdidos pela angústia da separação. Olhamo-nos de olhos em lágrimas e de coração despedaçado; E o barco ia se afastando enquanto eu em terra o via a se distanciar. Enquanto a minha alma  aos poucos era arrancada de mim e levada com ele. Vi o olhar dela lá no fundo. Mal eu sabia que era o último.
Os seus olhos estavam agora perdidos naquele imenso azul, num misero barco, em direção à Grecia. Eu cá fiquei... Chorei todos os dias quando percebi que o dinheiro não ia chegar para que os dois pudéssemos atravessar a fronteira. Chorei de tristeza por mim, de felicidade por ela, de medo por nós.
Hoje o olhar dela sumiu. Hoje estou sozinho porque não fugi da morte. Hoje estou sozinho porque a minha esposa ao fugir para exercer o seu direito à vida acabou por não resistir. Mas que ironia é esta?

Desde quando é que faz sentido pagar pelo direito de sobreviver?


Fictício - Carta de um Refugiado

1 comentário:

Cláudia S. Reis disse...

Infelizmente vivemos num mundo onde o dinheiro está a ganhar um peso gigante. Tudo tem um preço, até a nossa vida.