segunda-feira, 26 de junho de 2017

Vais amar-me?

 Mariana tem 25 anos, sofre de depressão e perdeu a fala. Escreve todos os dias pequenas cartas que guarda, num envelope de cartão, para que um dia o filho (que hoje tem apenas 5 anos de idade) as leia.



'' Há uma dor intolerante que me asfixia. Meu amor há um vazio obstinado em mim que não me permite sentir. Tenho os sentidos entorpecidos e quase já não os sei perceber. Em meu redor há uma nuvem negra que me escurece o coração, que me adormece a alma. Estou a perder-me e não há volta a dar. Meu amor, não sei como me salvar.''

'' Todos os dias vejo-te aí tão parado a olhar para mim, com esse teu olhar tão meigo e doce. E dizes-me ''Mamã anda bincaar''. Mas a mamã está sempre tão cansada. Então aconchegas-te em mim, dás-me beijinhos e dizes ''Vou tataar de ti''. Cai-me uma lágrima de todas as vezes que o dizes. Abraço-te. Não deveria ser eu a fazê-lo? ''

- Se há razão que me mantém de pé, é ele. Se há motivo para não desistir, é ele. Então escrevo-lhe. Escrevo-lhe pela necessidade que sinto de me justificar. Escrevo-lhe porque lhe devo em troca centenas de sorrisos e brincadeiras. Mas e quando ele abrir o envelope e pegar em cada uma das cartas? Achar-me-á um fracasso? E quando ele abrir o envelope, vai ter orgulho ou pena? Vai relembrar os mimos partilhados ou os meus longos silêncios? Vai amar-me ou odiar-me?

Ontem escrevi na capa do envelope:

''Se um dia a mamã não estiver e leres isto, não te esqueças: Foste a minha única razão de existir.''


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